Tech 23 Mai
Enquanto a pandemia de coronavírus ainda avança agressivamente em diversos locais do mundo, incluindo o Brasil, pesquisadores se voltam para pesquisas relacionadas a vírus transmitidos por mosquitos “negligenciados”.
Isto é, aqueles que não envolvem doenças já bastante conhecidas pela população brasileira, como dengue, zika e chikungunya, mas que ainda assim circulam pelo país.
Pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas (SP), elucidaram, pela primeira vez na América Latina, uma estrutura viral completa.
O trabalho revela detalhes inéditos do vírus mayaro, causador de uma doença com sintomas semelhantes ao da chikungunya e que circula no Brasil e na América Latina.
Os resultados obtidos foram publicados no periódico científico internacional Nature Communications, e devem servir de base para o desenvolvimento de novos métodos de diagnóstico, medicamentos e imunizantes.
Os pesquisadores afirmam que a prevenção da circulação de um vírus é impossível, mas o entendimento da biologia, transmissão e progresso das infecções são essenciais para possibilitar intervenção.
Entre os objetos de estudo estão, além do mayaro, o oropouche e o vírus da encefalite de St. Louis, todos em circulação no Brasil e América Latina, e sobre os quais os cientistas pouco conhecem.
Uma das principais técnicas adotadas no CNPEM para revelar a estrutura viral do mayaro foi a criomicroscopia eletrônica. Com o auxílio do principal projeto científico do Governo Federal, o laboratório de luz síncrotron de 4ª geração chamado Sirius que tem ajudado pesquisadores brasileiros a desvendarem a Covid-19, os cientistas pretendem avançar nas pesquisas.
O Sirius funciona como uma espécie de raio-X superpotente, que analisa diversos tipos de materiais em escalas de átomos e moléculas. Para observar estruturas, os cientistas aceleram os elétrons quase na velocidade da luz, fazendo com que percorram o túnel de 500 metros de comprimento 600 mil vezes por segundo.
Depois, os elétrons são desviados para uma das estações de pesquisa, ou linhas de luz, com o uso de ímãs que geram a luz síncrotron — que apesar de ser extremamente brilhante, é invisível a olho nu; os feixes são 30 vezes mais finos que o diâmetro de um fio de cabelo.
O trabalho sobre o mayaro, desenvolvido desde 2017 por uma equipe multidisciplinar com 20 pesquisadores e colaboradores, revelou detalhes da estrutura molecular do vírus com uma resolução de aproximadamente 100 mil vezes menor que a espessura de um fio de cabelo.
Além disso, a pesquisa descreve como o mayaro se organiza e como suas proteínas interagem para atingir esta organização. Esses são dados importantes para o entendimento do ciclo de replicação e eventuais vulnerabilidades do vírus.
O mayaro é uma espécie de “primo” da chikungunya e provoca as mesmas reações nos pacientes: febres e intensas dores musculares e articulares que podem se prolongar por muitos meses.
Também há registros de complicações sérias em decorrência do vírus, como hemorragia, problemas neurológicos e até morte. Ainda não há imunização ou tratamento específico para a doença.
O mayaro foi isolado pela primeira vez na década de 1950 a partir de amostras de sangue de pacientes infectados em Trinidade e Tobago, na América Central. No Brasil, surgiu ainda em 1955, em um surto em Belém (PA) e, posteriormente, em outras partes da Amazônia e do Centro-Oeste.
Em 2019, foram registrados casos do mayaro no Rio de Janeiro e um estudo da USP apontou a circulação da doença no interior de São Paulo. Além dos humanos, mamíferos em geral e até aves já foram descritos como hospedeiros para o mayaro, ou seja, são "reservatórios" cujo material infectado é transmitido pelos mosquitos. Os insetos do gênero Haemagogus são o principal vetor.
Você já conhecia o vírus mayaro? Qual sua opinião sobre a estrutura Sirius, utilizada em pesquisas como essa?
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