O fato de que profissionais da saúde trabalham sob pressão diariamente é conhecido por todos, afetando médicos e enfermeiros a nível físico e psicológico. Em vista disso, um estudo elaborado pela Universidade de Michigan analisou que as enfermeiras tendem a cometer suicídio a uma taxa dobrada em relação à população feminina geral, além de serem 70% mais propensas ao suicídio que as médicas do sexo feminino. É um dado alarmante, visto que as chances de suicídio, em geral, são maiores entre o sexo masculino.

Semelhante ao Brasil, o cargo da enfermagem é detido em sua maioria por mulheres nos Estados Unidos, representando 85% de todos os profissionais. De acordo com o professor Matthew Davis, da Escola de Enfermagem da Universidade de Michigan, a taxa de suicídios absurdamente maior entre as enfermeiras surpreendeu os envolvidos no estudo, que apontam a carga física e psicológica imposta sobre as enfermeiras que, além da necessidade de conciliar a vida pessoal e doméstica, são forçadas ao limite em suas profissões.

O que é importante para mim é que nos concentramos tanto no bem-estar dos médicos que, historicamente, não prestamos atenção suficiente a essa enorme força de trabalho que, com base em nossos dados, está em risco muito maior.

Apesar de não haver dados recentes do cenário pandêmico inclusos na pesquisa, a crise mundial da saúde protagonizada pelo coronavírus tem afetado as profissionais diretamente, o que poderia causar um grande aumento nos números. Em uma análise de 2.374 casos de suicídio entre profissionais da enfermagem em diferentes áreas dos Estados Unidos, 1.912 consistiam em pessoas do sexo feminino, com casos variando entre envenenamento e overdose de medicamentos. Davis acrescenta:

A razão pela qual olhamos para isso é porque as pessoas que trabalham em cuidados de saúde têm acesso mais fácil aos medicamentos e sabem como usá-los para overdose, o que também aumenta seu risco.

Ainda de acordo com a pesquisa, a população de enfermeiros do sexo masculino que cometem suicídio não supera a população masculina em geral. Christopher Friese, coautor da pesquisa, considerou que outros fatores — como a menor autonomia e a grande demanda de trabalho que atingiam os profissionais antes mesmo da pandemia — agravam os casos de estresse, ansiedade e depressão que os acometem.

De acordo com o professor, mesmo antes da Covid-19 assolar o mundo, as enfermeiras vinham relatando situações de abuso e estressores em local de trabalho, ressaltando o fato de que as profissionais têm 90% mais chance de enfrentar essas situações em relação aos ocupantes do cargo do sexo masculino. "Os empregadores precisam facilitar para enfermeiros e médicos que estão lutando para ter acesso à ajuda de que precisam", declarou.

Com a pandemia, a saúde mental vem sendo foco de especialistas do ramo, tanto para um público geral quanto para profissionais da saúde, em meio ao cenário que forçou a maior parcela da população a manter isolamento social. O fúnebre ambiente causado pelo grande número de mortes é um fator de risco de quadros depressivos para aqueles que enfrentam as fatalidades causadas pelo coronavírus.

Partindo da problematização, os especialistas reforçam a necessidade de programas que visam o bem-estar desses profissionais, tal como um maior controle do acesso aos medicamentos. Contudo, os quadros depressivos e casos de suicídio não devem cessar seu aumento tão cedo, principalmente em função da situação crítica do ramo, além da dificuldade em buscar ajuda devido a um estigma que faz os profissionais temerem pelos seus trabalho, conforme aponta Friese.